CARF – Restabelecimento do Voto de Qualidade

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No dia 12/01/2023, foi publicada a Medida Provisória nº 1.160[1] que retoma o voto de qualidade no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Nesse sentido, os conselheiros representantes da Fazenda Nacional (Presidentes de Turmas e Câmaras no CARF) têm voto com “peso duplo” no caso de empates de votação nos julgamentos, podendo, dessa forma, desempatar a favor da União.

Oportuno lembrar que o voto de qualidade havia sido extinto com a publicação Lei Federal nº 13.988/2020, oriunda da MP do Contribuinte Legal, a qual estabeleceu que os empates de julgamentos deveriam ser decididos a favor do contribuinte, salvo no caso das exceções estabelecidas na Portaria ME nº 260/2020, que incluíam declarações de compensação e responsáveis solidários.

Da Tramitação da Medida Provisória

As Medidas Provisórias estão previstas no artigo 62 da Constituição Federal e são normas com força de Lei editadas pelo Presidente da República em casos de urgência e relevância. Dada esta urgência, produz efeitos jurídicos imediatos, contudo, é necessária posterior apreciação do Congresso Nacional para que seja convertida definitivamente em Lei ordinária.

As Medidas Provisórias têm prazo de vigência inicial de 60 dias, prorrogáveis automaticamente por igual período, caso não seja apreciada pelo Congresso Nacional no período inicial. Se a MP não for apreciada em até 45 dias, contados da sua publicação, a mesma entra em regime de urgência, sobrestando todas as demais deliberações legislativas da Casa do Congresso Nacional em que estiver tramitando.

Receita Federal (RFB)

Em função de toda repercussão com a publicação da MP, a RFB, em 30/01/2023, publicou uma nota[2], acompanhada de uma apresentação com dados sobre os julgamentos do CARF, esclarecendo que “os auditores-fiscais da Receita Federal reconhecem parcial ou totalmente o direito do contribuinte em mais de 25% dos casos já na primeira instância. Quando se trata de lançamento eletrônico, o reconhecimento em favor dos contribuintes ultrapassa os 50%, principalmente por conta de documentos da malha fina”.

Além disso, a Receita Federal associa o período de vigência do desempate pró-contribuinte à perda arrecadatória. Segundo a RFB, “os empates favoreceram alguns pouquíssimos contribuintes, mas em valores bilionários”.

Supremo Tribunal Federal (STF)

A questão foi levada ao STF e já há maioria formada contra o voto de qualidade, mas o caso está suspenso por pedido de vista do ministro Nunes Marques[3].

Também está em tramitação a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7353[4] em que se discute a falta dos requisitos constitucionais de relevância e urgência para edição da MP nº 1.160. A ação ainda argumenta que a alegação para o retorno do voto de qualidade se limitou ao aumento de arrecadação.

Outro ponto abordado pela ADI é uma possível ofensa à separação dos poderes[5], sob o argumento de que a Medida Provisória, de competência do Poder Executivo, tem por objetivo revogar uma Lei aprovada anteriormente pelo Poder Legislativo.

CARF

No início do mês de fevereiro, o CARF realizou diversos julgamentos considerando a nova regra de desempate.

Em função disso, os contribuintes buscaram o Poder Judiciário para a obtenção de liminares com o objetivo de retirar os processos de pauta, sob o argumento da precariedade de se estabelecer a nova regra de desempate através de Medida Provisória.

A 4ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos autos do Mandado de Segurança sob o nº 1006765-81.2023.4.01.3400[6]., deferiu liminar para suspensão do julgamento do processo admintrativo nº 16561.720087/2014-23 até o final da apreciação do Mandado de Segurança.

Entretanto, outros processos levados a julgamento foram revertidos a favor do fisco pelo voto de qualidade.

Devido a toda essa repercussão negativa, o Carf vem suspendendo as sessões de julgamento.

Desdobramentos

No dia 14/02/2023, o governo realizou um acordo com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e com grandes contribuintes para a manutenção do voto de qualidade com a contrapartida de não haver cobrança de multas ao contribuinte. Com isso, a dívida a ser paga pelo contribuinte prejudicado pelo voto de qualidade seria acrescida apenas da taxa básica de juros.

A formalização desse acordo será entregue ao ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, que relata a ADI na qual a OAB pediu a derrubada da Medida Provisória[7].

Conclusão

Essa medida controversa está sendo considerada um retrocesso que pode, inclusive, aumentar a judicialização.

Isso porque, na hipótese de ocorrer empate no julgamento, fica demonstrado que existe uma grande controvérsia sobre o tema. Logo, a questão pode ser levada ao Poder Judiciário para uma nova oportunidade de discussão.

Não é de hoje que há uma série de questionamentos sobre o voto de qualidade. Verdade seja dita, não há imparcialidade por parte dos julgadores, especialmente aqueles representantes da Fazenda, considerando que um voto contrário à Fazenda é um voto contrário ao seu empregador, tendo em vista que eles são, em grande parte, auditores da Receita Federal.

Só resta aos contribuintes aguardar o desenlace da questão torcendo para que o voto de qualidade caia mais uma vez.

Por: Yule Menezes Pinheiro de Oliveira, Thaís de Menezes Araújo e Kamila Lima

  1. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Mpv/mpv1160.htm
  2. https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2023/janeiro/receita-federal-esclarece
  3. https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=484028&tip=UN
  4. https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6565961
  5. https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=501908&ori=1
  6. MS 1006765-81.2023.4.01.3400 4ª Vara Federal Cível daSeção Judiciária do Distrito Federal, juiz ITAGIBA CATTA PRETA NETO, liminar deferida em 30/01/2023
  7. https://www.conjur.com.br/2023-fev-14/governo-oab-fecham-acordo-volta-voto-qualidade